sexta-feira, dezembro 15, 2006

15 de Dezembro de 2006

O “tudo a eito”

Há determinadas profissões que devem ser imunes à crise… e à evolução.

Ter de fazer umas obras e encontrar profissionais eficientes é tarefa quase tão árdua quanto ver um jogo da II Liga com qualidade. Atenção que quando digo eficiente, não estou a ser picuinhas e nem exigente demais. Não, apenas peço alguém que consiga cumprir com aquilo que é contratado, conforme descrito, no prazo acordado. Nem precisa de ser de boa cara, que isso é pedir muito.

A dificuldade começa pelo orçamento… parece que nos vão fazer um favor do tamanho do mundo. Vão-nos conceder a honra de abdicarem de uns minutos do seu preciosíssimo tempo para, vejam lá o abuso da minha parte, “escrever aquilo que podia muito bem ser acertado ao fim”. O facto de eu querer saber de quanto é que vai ser o acerto não parece para aqui chamado. Nem interessa para nada.

Isto para não falar na sensação com que ficamos – ainda que sejam obras de vulto e muito bem pagas – de que nos estão a fazer um favor enorme. Pela postura parece que muitas chafaricas só ficariam contentes com a adjudicação de uma Ponte Vasco da Gama. Ainda que para orçamentar uma obra “modesta” demorem semanas, julgam-se estruturados para grandes voos. E mais que estruturados, injustiçados por não terem brevet. Se tivessem brevet, isso é que era. Ninguém os parava.

Há depois a lusa expressão do “trolhame” que mais me tira do sério. A frase da moda. O “tudo a eito”. O causador de todos os atrasos em Portugal. A mania de que se sabe programar. O terrível hábito de querer deixar tudo para a última hora, alegadamente por o trabalho só render se for feito “todo a eito”. Depois, com o prazo a aproximar-se, tem de se trabalhar noites e com o triplo dos funcionários que seria necessário se as obras fossem calendarizadas e os prazos respeitados. Mas não. Aqui não. É melhor ser tudo a eito… Mais caro, mais tarde, mas a eito.

Escusado será dizer que depois fica tudo “mais ou menos” pronto. Seja lá isso o que for. Mais ou menos pronto? O que é isso? Ou está pronto ou não está. É uma daquelas coisas em que não há meio-termo.

Tudo isto, segundo alguém com conhecimento de causa, tem tendência a piorar. Parece que agora os melhores profissionais estão a optar por trabalhar em Espanha, onde se ganha mais pelo mesmo serviço. Quem já viajou de madrugada, por exemplo, na A3 em direcção à Galiza, sabe que o que digo é verdade. São dezenas de ligeiros de passageiros cheiinhos. Ainda ontem, infelizmente, umas dessas viaturas sofreu um acidente e um trabalhador português foi cuspido e faleceu, sendo esse apenas mais um dos acidentes que têm vindo a acontecer com cada vez mais regularidade, o que é de lamentar. Mas voltando ao tema do texto, quer isto dizer que vamos ficar com os piores do pior. Se hoje em dia já é o que é arranjar um bom trolha, pintor, carpinteiro, serralheiro, picheleiro ou similar, temo pelo futuro. Resta-me desejar boa sorte na procura das agulhas no palheiro.

Acreditar

O Vitória cedeu o seu principal espaço publicitário – a frente das camisolas do equipamento oficial – a uma associação de apoio a crianças com cancro. E ainda uma parte da venda dos equipamentos. O que, para além do motivo óbvio e indiscutível, é bom, porque é sinal de que vêm equipamentos ainda esta época.

Causa nobre e nobre gesto do Vitória ao apoia-la, mostrando que é uma verdadeira instituição de utilidade pública. Generosidade inquestionável.

Não fico, no entanto, inebriado o suficiente e nem com enternecido com esta, volto a dizê-lo, nobre acção de marketing demonstradora de uma enorme responsabilidade social que me tolha o raciocínio a ponto de deixar de questionar se esta não foi uma saída airosa para a incapacidade de vender a marca Vitória e a sua principal montra. Ainda que, como tem vindo a ser advogado, tenham existido propostas concretas para a sponsorização do Vitória a nível das camisolas – e tudo o que o pack sponsor oficial inclui, logicamente – e as mesmas não tenham atingido os valores tidos por aceitáveis para esse efeito, não seria interessante juntar uma série de pequenos sponsors que, sozinhos não conseguiam pagar o que o Vitória vale, mas se associassem ao “mecenas” Vitória e suportassem indirectamente a inserção do logo ACREDITAR?

Isso sim, a meu ver seria interessante. O Vitória ajudaria uma causa nobre e a Direcção demonstrava capacidade para encontrar soluções para fazer face às necessidades de tesouraria. É que assim começa a ser cada vez menor a margem para depois vir desculpar-se com buracos e ao mesmo tempo fazer peditórios para autocarros. Parece-me de uma incongruência atroz.

Se me perguntarem se acho que o Vitória deve ser altruísta, respondo imediatamente que sim.

Se me perguntarem se acho que o Vitória tem vindo a ser altruísta e atento a causas sociais, digo com agrado que ocasionalmente sim.

Se me perguntarem se acho que “dar” o nosso mais nobre espaço publicitário (e que num período de quebras de receita poderia representar uma fatia importante do orçamento do clube) me parece uma decisão correcta a nível da gestão, respondo claramente que, em não havendo mecenas que a comparticipem, me parece uma fuga para a frente, uma manobra de diversão, uma saída airosa para um problema que não foi resolvido.

Mas como não me perguntaram nada… digo apenas que o coração diz que acredita e a razão cada vez menos.

Estudante e pouco trabalhador

Ontem ouvi na TSF umas declarações do ministro Mariano Gago a propósito de uma série de medidas, por ele defendidas, tendentes a regulamentar e incentivar a ocupação parcial dos estudantes do ensino superior. Dizia o ministro que Portugal deve ser dos únicos países onde se tem como dado adquirido que o estudante do ensino superior o tem de ser em exclusivo. Dava o exemplo de uma série de países, bastante mais ricos que nós, onde era perfeitamente normal os estudantes terem uma ocupação temporária, que os ajude a custear as suas despesas.

Parece-lhe mal, caro leitor? A mim não. Muito pelo contrário. Acho inclusive – e esta note-se não é uma teoria com qualquer base científica, mas apenas baseada na minha opinião pessoal – que muitos problemas de insucesso no ensino superior advêm precisamente do facto de os estudantes o serem em exclusivo. Têm tempo livre a mais. E mais ainda quando muitos deles saem pela primeira vez da casa dos pais, aquando do ingresso no ensino superior, a falta de regras dá mau resultado.

E o presidente da AAC, supostamente em resposta ao ministro – digo supostamente porque me deu a sensação que respondeu a alhos com bugalhos – vem responder que o ministro devia era averiguar o porquê de 40% dos alunos que entra no ensino superior não concluir o curso e que o ministro devia era investir nas instalações. Porque – dizia ele – se sem ocupação parcial, os níveis de insucesso estão como estão, se os pobres estudantes ainda tivessem de trabalhar, como seria…

Au contraire, digo eu. Muitos dos que abandonam precocemente a universidade fazem-no porque provavelmente não fazem ideia do esforço que os pais têm de fazer para que eles possam prosseguir os seus estudos a esse nível.

Se lhes saísse um pouco mais do corpo, já perceberiam o que a vida custa e o empenho seria com certeza maior. As desnorteadas declarações do presidente da Associação Académica de Coimbra só levam a que a vox populi depois seja do género: Não sobrava era tanto tempo para copos e tainadas…

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